A CAMINHO DA PLENITUDE
Quando se é jovem, o que se quer é ter um uma vida intensa e agitada.
Depois dessa fase, vem o casamento e com ele os filhos. Somado a tudo isso, os
problemas que não são poucos. E a gente
vai levando, vai enfrentando os embates da vida, driblando-os.
Chega, então, um tempo, quando se tem mais idade, por volta dos sessenta
anos, o que se quer é serenidade.
Agora, por exemplo, estou completamente só e, por incrível que pareça,
feliz. É tempo de férias, verão, praia. Sei que já é noite avançada, pois não
ouço barulho no prédio em que moro nem tampouco carros passando pela rua. Não
me importo nem um pouco com o horário, pois amanhã não preciso me acordar às 6
horas, me arrumar, tomar café e ir pra escola.
De alma bem leve, coração sereno
e tranquilo, mergulho em mim mesma, e enquanto escrevo, ouço o barulho do mar.
Quanto prazer, quanta paz de espírito...
Não há cobranças, meu marido não
está, a minha cachorrinha a quem tanto amo, também não está, nem o tic tac do
relógio para me avisar que já é hora de ir pra cama.
Aos pouquinhos, vou me descobrindo que para se ser feliz, não é preciso
estar rodeado de gente, basta estar consigo mesmo. São momentos como este,
imprescindíveis, para que possamos pensar e compreender a si próprio, ao outro,
até mesmo à época que estamos construindo. Estes momentos nos renovam,
recarregam a bateria para novos enfrentamentos.
Isto é parte do que sempre quis, tanto quanto a ar que respiro, a glória
de estar por alguns momentos só, após meses de trabalho e de preocupações com
meus alunos. E é este silêncio que me leva à reflexão para que eu possa
entender-me e entender aos outros. Quero, por alguns instantes, me esquecer que
lá fora, há alguém sendo roubado, assaltado ou desrespeitado. Quero esquecer os
desaforos que, muitas vezes, temos que engolir, porque fomos ensinados que o
amor e o respeito devem ser fortes o suficiente para aguentar os revezes da convivência. Quero aproveitar estes
momentos para fingir que só tenho responsabilidades comigo mesma, embora saiba
que lá, no meu íntimo, o amor pelos meus filhos, neta e marido vem, às vezes,
acompanhado de problemas que me deixam
angustiada.
Por algumas horas, pretendo ficar aqui, no meu porto seguro, falando
comigo mesma e ouvindo o sibilar das ondas do mar. Neste momento, estou olhando
pela janela e vendo as estrelas que deslizam em sua dança de anjos, e a lua,que
brilha como uma moeda de prata, olha
para mim. É pura magia. A noite é só minha. E este momento também.
Amanhã será outro dia, certamente
não estarei mais sozinha e os meus pensamentos já não serão mais só meus, serão
compartilhados com outras pessoas. E aí tudo voltará à normalidade do dia a
dia. Mas a vida tem me ensinado que devemos impor a nós mesmos momentos de
meditação e entrega. E que não devemos deixar que nos impeçam de fazer o que precisamos
fazer. Que devemos imprimir a nossa marca no mundo, tornando-a profunda para
durar.
E, ao me acordar, sem horário marcado, quero me espreguiçar
languidamente sobre os meus lençóis macios e delicados, arrumar a mesa do café
com toda a dignidade e aparato merecidos e bem no centro da mesa estará, como
sempre, a minha flor preferida: a orquídea branca que, com certeza, estará me
agradecendo por lhe fazer companhia. E enquanto absorvo o meu café,
contemplo-a, admirando as suas pétalas brancas e o seu miolo levemente
amarelado se assemelhando a uma boca semi aberta,como se quisesse me dizer: “ bom
dia, eu te amo”! E como protagonista
desta cena, estarão, do outro lado da rua, as alvas ondas que se movimentam
frenéticas como se fossem bailarinas dançando sobre as águas revoltas dos mares
do nosso litoral gaúcho.
Uma leve brisa com cheiro de mar me acordou de meus devaneios e me
alertou que já é hora de ir pra cama.
29/04/2012
Alda Maria Kruse da Costa
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